Pode parecer impensável que, nos dias de hoje, que um piloto conquiste o título da principal categoria do automobilismo sem que tenha obtido o maior número de pontos ao longo dos Grande Prêmios da temporada, não é mesmo? Pois acredite que nem sempre foi assim na Fórmula 1 – e este regulamento, inclusive, foi decisivo para o primeiro dos três campeonatos do brasileiro Ayrton Senna, em 1988.
Naquela temporada, Senna conquistou um total de 94 pontos ao longo das 16 corridas disputadas. O francês Alain Prost, então bicampeão e que buscava o tri, somou 105, mas terminou somente na segunda colocação da classificação final. Só que… o que pode ter acontecido?
Como funcionava o sistema de pontos da Fórmula 1 em 1988?
A explicação é razoavelmente simples. Acontece que, naquela época, o regulamento da Fórmula 1 era bastante diferente do que conhecemos atualmente – inclusive no sistema de pontuação.
Em 1988, apenas eram considerados para a classificação do Mundial de Pilotos os melhores 11 resultados ao longo do ano (os demais cinco eram descartados). A ideia era tentar valorizar mais as vitórias e o arrojo do piloto, em detrimento da regularidade ao longo do ano.
Além disso, os pontos por classificação em cada GP eram bem diferentes do sistema atual. Se hoje uma vitória vale 25 pontos, naquele ano quem terminasse no topo do pódio somava apenas 9, enquanto o segundo colocado recebia 6 e o terceiro, 4. Ainda pontuavam os quarto, quinto e sexto lugares, com 3, 2 e 1 tentos, respectivamente.
Desta forma, contando apenas os 11 melhores desempenhos na temporada de 1988, Senna somou 90 pontos e precisou descartar apenas 4 (que eram oriundos de um quarto e de um sexto lugares, além de mais três provas em que não pontuou). Valeram para a classificação, então, oito vitórias e três segundos lugares.
Prost, por sua vez, chegou a acumular 14 pódios ao longo da temporada, com sete vitórias e sete segundo lugares – além de ter abandonado duas provas. Mas, como apenas 11 resultados contavam para a classificação final, acabou tendo 18 pontos descartados. Dos 105 acumulados, apenas 87 valeram para a temporada. Assim, Senna celebrou o primeiro de seus três títulos mundiais na Fórmula 1 com 90 pontos, três a mais que seu principal rival.
Sistema de descartes na classificação da Fórmula 1
Os descartes não foram novidade na temporada de 1988 da F1. Na verdade, este sistema vigorou na maior parte da história da categoria, desde a sua criação em 1950 até a temporada de 1990. Foram 41 anos neste formato.
Apenas de 1991 em diante que a Fórmula 1 passou a considerar todos os resultados que os pilotos obtêm ao longo da mesma temporada. Antes, o que variava era a quantidade de descartes permitidos e quando eles poderiam ser aplicados.
Em 1964, por exemplo, apenas os seis melhores resultados em 10 GPs valeriam para a classificação final. E este regulamento, inclusive, permitiu que outro piloto comemorasse o título da temporada: o britânico John Surtees, que levou a melhor sobre o compatriota Graham Hill.
Surtees, na ocasião, somou 40 pontos com duas vitórias, três segundos lugares e um terceiro lugar, e pôde descartar quatro abandonos que não haviam lhe valido pontos. Hill, por sua vez, somou 41 ao longo do ano (dois triunfos, três vices, um quarto e um quinto lugares), mas precisou descartar 2 preciosos pontos referentes ao quinto lugar. Classificação final: Surtees campeão e Hill vice, com 39.
Os casos de Surtees e Senna, na realidade, foram os únicos em que um piloto se sagrou campeão de uma temporada da Fórmula 1 sem ter somado a maior quantidade de pontos ao longo do ano. Nas demais 39 edições entre 1950 e 1990 o formato não interferiu diretamente na definição do vencedor.