All-white: por que tenistas jogam de branco em Wimbledon?

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Wimbledon tennis

"Wimbledon Tennis, Court 3, 2015" by Su--May is licensed under CC BY 2.0 .

Wimbledon é o mais tradicional torneio do circuito profissional de tênis, e não à toa. O Grand Slam britânico foi realizado pela primeira vez em 1877 e até hoje, quase 150 anos depois, diversos protocolos são mantidos e fiscalizados pela organização. Um deles, aliás, há muito tempo gera incômodo entre os principais atletas do circuito: a regra do “all-white” (ou “tudo branco”).

Mas por que esse código de vestimenta existe e por que os tenistas jogam de branco em Wimbledon até hoje? E o que os tenistas pensam disso? Existe alguma possibilidade de este protocolo acabar?

Nos parágrafos a seguir, vamos explicar o motivo do “all-white” no torneio na “grama sagrada” do All England Lawn Tennis and Croquet Club e relembrar tenistas que já enfrentaram esta normativa. Acompanhe!

Por que os tenistas jogam de branco em Wimbledon?

A origem desta regra – e principalmente sua manutenção até os dias de hoje – é relativamente insólita, especialmente se pensarmos em um torneio disputado no verão e que possui partidas que facilmente ultrapassam as 3 horas de duração.

Segundo a enciclopédia Britannica, o dress code da primeira edição de Wimbledon foi escrito no fim do século XIX, época em que a sociedade local considerava que se exibir em público com manchas de suor nas roupas era “desagradável”.

A solução para esconder as marcas de transpiração nos atletas seria utilizar tecidos brancos, em detrimento dos coloridos – e que exporiam a sudorese dos tenistas. E Wimbledon, que é bastante adepto de tradições, resolveu manter esta regra para as edições futuras do torneio.

Acontece que a competição se ateve fortemente a este costume e se recusou a abrir várias exceções. Não bastava que as peças fossem predominantemente brancas: os detalhes coloridos não podem exceder sequer 1 centímetro de grossura.

“Um único acabamento colorido ao redor do pescoço ou do punho das mangas é aceitável, mas não deve ter mais de 1 cm (10 mm)”, descreve o código de vestimenta de Wimbledon, em um documento com dez tópicos. Um deles, aliás, ressalta que “branco não inclui off white e nem creme”.

(A organização só não estabelece se roupas brancas que já ficaram um pouquinho encardidas também são permitidas, mas talvez seja um item desnecessário)

Tem alguma chance de o protocolo “all-white” acabar em Winbledon?

Provavelmente não tão cedo – afinal, Wimbledon parece não se incomodar com eventuais pressões financeiras ou dos atletas para o fim de algumas tradições. “Organizamos um torneio de tênis, não um evento”, declarou em 2014 o então presidente do All England Club, Philip Brook, em publicação feita pela revista Newsweek.

Mas, se você prestou atenção nos jogos de 2023, talvez tenha se perguntado: “Por que as tenistas podem usar shorts coloridos em Wimbledon?”. Acontece que, no final de 2022, a organização do Grand Slam britânico acatou um pedido das jogadoras e liberou a utilização de shorts de outra cor sob a saia branca. O objetivo desta medida é deixar as tenistas mais tranquilas em relação ao período menstrual – afinal, peças brancas poderiam expô-las a eventuais manchas de sangue nas partes íntimas.

“Esperamos que esse ajuste de regra ajude os jogadores a se concentrarem exclusivamente em seu desempenho, aliviando uma fonte potencial de ansiedade”, declarou recentemente Sally Bolton, chefe-executiva do All England Club.

Esta medida pode ser considerada uma importante vitória das jogadoras – afinal de contas, Wimbledon chegou a chamar a atenção de atletas que, depois de suarem durante a partida, deixaram transparecer que utilizavam roupa interior de cor diferente do branco.

Quais tenistas já desafiaram o dress code de Wimbledon?

A regra de vestimenta do torneio britânico não é das mais queridas pelos tenistas que pisam na grama sagrada de Wimbledon. Tanto que alguns atletas, dos mais rebeldes e até mesmo os mais “classudos”, já tiveram rusgas com a organização. Listamos alguns casos:

Maria Esther Bueno

A maior tenista brasileira de todos os tempos ficou marcada por levantar o troféu de Wimbledon em oito ocasiões (três em simples, cinco em duplas) entre 1959 e 1966. Mas ela também é lembrada por ter causado alvoroço nas arquibancadas do All England Club na semifinal de 1962, quando entrou em quadra com um vestido branco que possuía um forro rosa-choque.

Ao longo de sua vida, a brasileira gostou de recordar o caso do “shocking pink” do vestido que foi feito sob medida pelo renomado estilista e ex-tenista Ted Tinling. Certa vez, em entrevista para o SporTV, ela detalhou que o forro do vestido ficava à mostra durante o movimento do saque, e metade das pessoas nas arquibancadas (localizadas atrás dela) reagia em choque, enquanto a outra parte do público só foi entender o que estava acontecendo quando as tenistas trocaram de quadra.

Maria Esther Bueno não foi punida por Wimbledon, que fez uma advertência severa a Ted Tinling e ainda reforçou a dureza do dress code para a edição seguinte do torneio, proibindo detalhes coloridos na roupa de jogo.

Gustavo Kuerten

Outro brasileiro que também esteve na mira da regra de Wimbledon foi Guga – especialmente depois do seu título em Roland Garros de 1997 com o espalhafatoso uniforme amarelo e azul. À época, questinou-se bastante se o catarinense desafiaria o branco tradicional ou se adequaria ao código dos ingleses.

Guga, porém, entrou em quadra vestindo a cor de Wimbledon – sua ousadia foi limitada a uma bandana preta com detalhes brancos. Mais tarde, em 2000, ele também chamou a atenção ao entrar em quadra com o cabelo penteado em trancinhas, mas respeitando o dress code. 

Andre Agassi

O genial tenista de Las Vegas levava o visual muito a sério no início de sua carreira e gostava de desafiar o tradicionalismo do tênis com looks ousados e cheios de cor – que muitas vezes não conversavam entre si. Ele era tão vaidoso que o próprio Agassi admitiu que um dos motivos para ter perdido a final de Roland Garros de 1990 era o medo de que sua peruca de cabelos longos, usada para disfarçar um início de calvície, se descolasse no meio do jogo.

Mas Agassi não desafiou o all-white de Wimbledon com rebeldia: o então garoto prodígio foi além e preferiu boicotar o Grand Slam inglês, recusando-se a disputar as edições de 1988, 1989 e 1990 do torneio. Ele, que havia caído na primeira rodada em sua participação inaugural em 1987, voltou somente em 1991. Em 1992, Agassi foi campeão do torneio.

Nick Kyrgios

Outro bad boy do tênis, mas de uma geração mais recente, que se deparou com a dureza da regra all-white foi o australiano Nick Kyrgios. Ele foi chamado a atenção na edição de 2022 por ter entrado e saído de quadra utilizando tênis e boné vermelhos – muito embora tenha utilizado peças brancas durante o jogo.

Roger Federer

O rigor dos ingleses quanto à vestimenta de Wimbledon afetou até um dos tenistas mais elegantes dos últimos tempos e, mais do que isso, o maior vencedor do torneio: Roger Federer.

Em 2013, quando já tinha sete de seus oito títulos de Wimbledon no currículo, Federer venceu na estreia o romeno Victor Hanescu por fáceis 6/3, 6/2 e 6/0. Mas a organização não aprovou o solado cor de laranja do tênis Nike do suíço e solicitou que o calçado fosse trocado para a segunda rodada.

No jogo seguinte, o suíço entrou em quadra com um calçado totalmente branco e, curiosamente, foi eliminado de maneira surperendente para o ucraniano Sergiy Stakhovsky, então número 116 do mundo, por 3 sets a 1 – parciais de 6/7 (5-7), 7/6 (7-5), 7/5 e 7/6 (7-5).

O resultado, que é considerado uma das maiores zebras da história de Wimbledon, colocou fim a uma série impressionante da carreira do ex-líder do ranking da ATP: foi a primeira vez após 36 edições de Grand Slam em que Federer não alcançou pelo menos as quartas de final – a última vez havia sido em 2004, quando o já veterano Guga derrotou o suíço na terceira rodada de Roland Garros.